sábado, 21 de janeiro de 2017

DEUS ANDA POR AÍ À PROCURA DE TI!

O Evangelho de Mateus 4,15-16 refere com precisão que, «quando Jesus soube que João Baptista tinha sido preso, retirou-se para a Galileia» (Mateus 4,12), e, «desde então, começou a pregar» (Mateus 4,17a). Uma prolepse e uma surpresa, podemos dizer mesmo um escândalo. A prolepse: ao anotar a prisão de João Baptista, o narrador não está tanto a registrar um facto histórico, mas mais a desvendar já aquilo que um dia acontecerá também a Jesus. A surpresa e o escândalo: era do sentir comum que o anúncio messiânico fosse feito no coração do judaísmo, em Jerusalém, e não numa região periférica, desprezada e contaminada pelo paganismo, como era esta «Galileia dos pagãos» (Mateus 4,15). É para justificar e iluminar este estranho e inesperado começo, que Mateus se vê como que obrigado a citar por inteiro a passagem apropriada de Isaías 8,23-9,1.
Luz de Jesus a iluminar a noite da Galileia. Voz de Jesus a romper aquele espesso manto de silêncio: «Convertei-vos, porque está próximo de vós o Reino dos Céus!» (Mateus 4,17b). Esplêndida Luz, esplêndida Voz, esplêndido Amor de Deus, esplêndida surpresa divina! Ainda antes de nos convidar a que nos interessemos por Deus, a Bíblia mostra que é Deus que se interessa primeiro por nós, tomando a iniciativa de percorrer as nossas estradas para nos vir visitar a nossas casas! É esta a maravilha desconcertante do Evangelho!
E assim continua no velho texto de Mateus e nas nossas estradas de hoje. Verificação: Jesus caminha ao longo das praias do Mar da Galileia, e vê dois irmãos, Simão e André, ocupados nos trabalhos da pesca, e diz-lhes: «Vinde atrás de mim (deûte opísô mou)!» (Mateus 4,19). A resposta é imediata: «Deixaram logo as redes, e seguiram-no!» (Mateus 4,20). E andando um pouco mais, viu outros dois irmãos, Tiago e João, que, com o pai, Zebedeu, consertavam as redes na barca. Também os chamou. E também eles deixaram logo a barca e o pai, e seguiram-no (Mt 4,21-22).
Note-se bem que Jesus desce ao nosso mundo, caminha pelas nossas estradas e vem ter connosco aos nossos lugares de trabalho. E é aí que nos chama. Não espera por nós no cenário sagrado das nossas Igrejas! Não nos obriga a aprender uma doutrina, nem sequer nos entrega um projecto de vida, mas chama-nos a segui-lo («vinde atrás de mim»), e partilha connosco a sua vida, como o Mestre faz com os seus discípulos. Não nos põe a fazer uma espécie de estágio, para que um dia nos tornemos Mestres. Nós permanecemos sempre discípulos, e um só é o Mestre. Não nos coloca num estágio, num estado, num estrado, numa estante, mas num caminho! E um dia mais tarde, ouvi-lo-emos ainda dizer: «Ide!»É sempre no caminho que nos deixa.

Tu, Senhor, Tu falas
E um caminho novo se abre a nossos pés,
Uma luz nova em nossos olhos arde,
Átrio de luminosidade,
Pão
De trigo e de liberdade,
Claridade que se ateia ao coração.

Lume novo, lareira acesa na cidade,
És Tu, Senhor, o clarão da tarde,
A notícia, a carícia, a ressurreição.

Passa outra vez, Senhor, dá-nos a mão,
Levanta-nos,
Não nos deixes ociosos nas praças,
Sentados à beira dos caminhos,
Sonolentos,
Desavindos,
A remendar bolsas ou redes.

Sacia-nos.
Envia-nos, Senhor,
E partiremos
O pão,
O perdão,
Até que em cada um de nós nasça um irmão.

António Couto


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