sábado, 20 de dezembro de 2014

JÁ NÃO ESCRAVOS, MAS IRMÃOS - Uma Mensagem de PAZ

Para o início de um novo ano, uma vez mais, o Papa dirige a sua MENSAGEM PARA A JORNADA MUNDIAL DA PAZ, a todas as pessoas em particular, «povos do mundo, aos chefes de Estado e de Governo e aos responsáveis das várias religiões» os seus votos de paz e a oração «a fim de que cessem as guerras e os conflitos e os inúmeros sofrimentos provocados quer pela mão do homem quer velhas e novas epidemias e calamidades naturais». O Papa recorda o princípio de que «o anseio duma vida plena (...) contém uma aspiração irreprimível de fraternidade, impelindo à comunhão com os outros, em quem não encontramos inimigos ou concorrentes, mas irmãos que devemos acolher e abraçar». Sendo o homem um ser relacional é fundamental para o seu desenvolvimento que sejam reconhecidas e respeitadas a sua dignidade, liberdade e autonomia. «O flagelo generalizado da exploração do homem pelo homem fere gravemente a vida de comunhão e a vocação a tecer relações inter-pessoais marcadas pelo respeito, a justiça e a caridade». Inspirando-se na Carta de São Paulo a Filémon (Flm 15-16), Francisco, Papa, recorda-nos que a conversão a Cristo, pelo Baptismo, «constitui um novo nascimento que regenera a fraternidade como vínculo fundante da vida familiar e alicerce da vida social». No entanto, continua o Santo Padre, «os seres humanos não se tornam cristãos, filhos do Pai e irmãos em Cristo por imposição divina, isto é, sem o exercício da liberdade pessoal». Realmente, houve períodos na história da humanidade em que a instituição da escravatura era geralmente admitida e regulamentada pelo direito. «Hoje, na sequência duma evolução positiva da consciência da humanidade, a escravatura foi formalmente abolida do mundo». Mas, ainda hoje, há milhões de pessoas que são privadas da liberdade e constrangidas a viver em condições semelhantes à escravatura: trabalhadores escravizados e desprotegidos, em termos de leis laborais, em trabalhos domésticos, agrícolas e industriais; os migrantes na clandestinidade que aceitam viver e trabalhar em condições indignas; pessoas, nomeadamente menores, obrigadas a prostituírem-se e outros objecto de tráfico e comercialização para remoção de órgãos, soldados, pedintes, correios de droga; os cativos por grupos terroristas... «Na raiz da escravatura, está uma concepção da pessoa humana que admite a possibilidade de a tratar como um objecto», declara o santo Padre. Juntamente com esta «causa ontológica», há outras causas: 1) a pobreza, o subdesenvolvimento e a exclusão; 2) a corrupção daqueles que, para enriquecer, estão dispostos a tudo, «Isto acontece quando, no centro de um sistema económico, está o deus dinheiro, e não o homem, a pessoa humana»; 3) as guerras, a violência, a criminalidade e o terrorismo. Este fenómeno de "escravatura moderna" é marcado pela impressão duma indiferença geral que é imperioso combater com o tríplice empenho de todos, nomeadamente a nível institucional: prevenção, protecção das vítimas e acção judicial contra os responsáveis, num esforço comum e global. «Os Estados deveriam vigiar por que as respectivas legislações nacionais sobre migrações, o trabalho, as adopções, a transferência das empresas e a comercialização de produtos feitos por meio da exploração do trabalho sejam efectivamente respeitadoras da dignidade da pessoa». «Torna-se necessária uma cooperação a vários níveis, que englobe as instituições nacionais e internacionais, bem como as organizações da sociedade civil e do mundo empresarial» e, a par com a responsabilidade social das empresas, aparece a «responsabilidade social do consumidor». Conclui o Papa Francisco: «Desejo convidar cada um, segundo a respectiva missão e responsabilidades particulares, a realizar gestos de fraternidade a bem de quantos são mantidos em estado de servidão. Perguntemo-nos, enquanto comunidade e indivíduo, como nos sentimos interpelados quando, na vida quotidiana, nos encontramos ou lidamos com pessoas que poderiam ser vítimas do tráfico de seres humanos ou, quando temos de comprar, se escolhemos produtos que poderiam razoavelmente resultar da exploração de outras pessoas». «Sabemos que Deus perguntará a cada um de nós: "que fizeste do teu irmão?" (Cf. Gen 4, 9-10). A globalização da indiferença requer de todos nós que nos façamos artífices duma «GLOBALIZAÇÃO DA SOLIDARIEDADE DA FRATERNIDADE para devolver, a todos os que vivem sobrecarregados, a esperança. (Papa Francisco)

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

AS ANTÍFONAS MAIORES DO ADVENTO

De 17 a 23 de Dezembro, as sete antífonas que acompanham o canto do Magnificat, nas Vésperas da Liturgia das Horas e na aclamação ao Evangelho, na Eucaristia, constituem uma série, chamada das «antífonas maiores» ou «antífonas do Ó».Cada uma delas começa, de facto, com uma invocação - «Ó» -, dirigida ao Senhor Jesus. Este Septenário é muito antigo, remontando aos tempos do Papa Gregório Magno, cerca dos anos 600, e encontra-se no Liber responsalis, sive antiphonarius como antífonas do texto evangélico do Magnificat, nos sete dias que, no final do Advento, precedem a celebração do Natal. Uma primeira observação confirma a unidade e a ordem desta série de antífonas. Quem lê em latim a primeira letra, que em cada uma delas, vem depois do «Ó» inicial,lido ao contrário, descobre um acróstico significativo: ERO CRAS: (Sapientia, Adonai, Radix, Clavis; Oriens, Rex, Emamanuel), ou seja, «serei/estarei amanhã». Vê-se que a série se divide em duas partes: as quatro primeiras antífonas, de 17 a 20 de Dezembro, e as três últimas, de 21 a 23. De facto, elas foram compostas muito cuidadosamente: depois de um título, introduzido pelo «Ó» e justificado por duas linhas, salvo na quinta antífona, a última linha formula um pedido introduzido por «veni/vinde». Além disso, todas estas linhas constituem mais ou menos um bloco de textos, na maioria do Antigo Testamento, que anunciam o Messias. Já estamos, portanto, na atmosfera do Advento, tão bem afirmado na Liturgia da Palavra depois da reforma litúrgica desejada pelo II Concílio do Vaticano. Maurice Gilbert, sj

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

VIDA CONSAGRADA

Recentemente, no final de um encontro com os superiores gerais de vários institutos religiosos, o Papa Francisco dedicou o ano 2015 à Vida
Consagrada (VC). Um conjunto de eventos será concretizado ao longo deste ano, com o intuito de despertar a comunidade eclesial em particular, e a sociedade em geral para esta “realidade periférica” na vida da Igreja. As pouquíssimas vocações e a elevada taxa de abandono de alguns membros fazem com que o futuro de algumas obras, até então fundadas e geridas pelos institutos, estejam em causa. Para que serve a vida consagrada? Qual é a sua missão? Ela nasceu no longínquo séc. II e III quando um crescente número de homens e mulheres, motivados por um desejo de imitar Jesus, renunciaram à vida normal e professaram os conselhos evangélicos – os votos de pobreza, castidade e obediência. Deste modo, procuravam seguir de forma mais perfeita o Mestre sendo como Ele foi, pobre entre os pobres, casto por causa do Reino dos Céus e obediente à vontade do Pai. Aos poucos, os religiosos ganharam o seu lugar na Igreja. A sua fisionomia diverge da dos leigos que “estão no mundo” e da dos clérigos, a hierarquia da Igreja formada exclusivamente por homens. Hoje a expressão VC abarca uma grande variedade de institutos masculinos e femininos que incluem desde os grupos mais austeros e recolhidos como os monges da Cartuxa, aos de perfil mais missionário, como as sociedades de vida apostólica, os Vicentinos, que têm por missão realizar, em cada tempo e lugar, a profecia de Isaías, a mesma que Jesus assumiu como programa de vida: «O espírito do Senhor está sobre mim, porque o Senhor me ungiu e me enviou a anunciar a boa nova aos pobres, a curar os corações atribulados…». A VC tem futuro? Sabemos, ainda que vagamente, que ela foi em muitas áreas uma “ponta de lança” da ação Igreja. Os seus membros deixaram marcas nas mais variadas áreas desde a culinária à arquitetura, sem esquecer a ciência e a cultura. Hoje é difícil percorrer o país e o continente europeu sem encontrar organizações dinamizadas por algum instituto religioso. Os colégios e as universidades, os lares de idosos e os orfanatos, as clínicas e os hospícios, são estruturas que testemunham a vitalidade de outrora. Os objetivos para este ano foram definidos: 1. Fazer memória agradecida do passado; 2. Abraçar o futuro com esperança; 3.Viver o presente com paixão. O desafio está lançado: rezemos pela VC. Pe. Nélio Pita

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

O Advento é uma interrupção

Quando penso neste tempo do Advento e no seu significado profundo muitas vezes me recordo de um livro do poeta brasileiro João Cabral de Melo Neto, Morte e Vida Severina. É um livro de poesia. A Sophia de Mello Breyner gostava muito desse livro. E esse livro o que é que conta? Conta a história do Severino. O Severino é o Homem, é o Adão, é o Homem sobre a terra, é o Job. Este Severino é um homem provado porque a vida é implacável, a vida é dura, a vida não retribui o impacto, o sonho, o investimento afetivo que nós nela colocamos. Este Severino sente-se só, abandonado, espoliado sobre a terra. E vai numa demanda muito grande à procura de soluções e remédios que não encontra nunca. E então decide, dramaticamente, que a vida não tem sentido, que ele não encontra respostas para as perguntas que traz e que talvez o melhor seja pôr cobro, ele, à própria vida. Vai andando perto de um rio e a dada altura encontra um carpinteiro chamado José, e pergunta ao carpinteiro se ele, vivendo ali, naquele braço de rio, sabe se o rio é suficientemente fundo e cheio de lodo para que uma vida se perca. O carpinteiro percebe a questão que Severino lhe coloca e começa a convencê-lo a não fazer aquilo, a não dispersar a sua vida. Severino pergunta-lhe, interroga-o: “Então dá-me uma razão. Dá-me uma razão que seja, que diga que a vida vale a pena. Dá-me uma razão que seja para que eu não faça isso.” Quando estavam os dois nesta discussão, a discussão é interrompida, a conversa é interrompida. É interrompida por um coro de vizinhos, de parentes e de conhecidos que vem anunciar, cantando, a José que ele acaba de ser pai. Então nós somos conduzidos até ao lugar onde este menino nasce e José canta a alegria daquela vida que nasce. Depois, no final, ele volta-se para Severino e diz que ele não tem uma resposta para dar a Severino, não tem uma resposta sobre se a vida tem sentido, se a vida vale a pena. Ele não tem uma resposta por palavras, mas ele diz: “Nenhum homem é capaz de responder. É a vida que responde. É a vida que responde.” E a vida responde como? A vida responde manifestando-se, dando-se a si mesma, abrindo-nos ao desabalar do espetáculo que é a própria existência, a esse inacreditável milagre que é a própria vida. É olhando, acolhendo e abraçando esse milagre que nós somos curados das nossas dúvidas, daquilo que em nós parece que não tem solução, que não tem remédio. É quando nós abraçamos e confiamos no milagre da vida, daquilo que continuamente nasce e explode de vida no mundo e em nós é que podemos ser curados das nossas provações, das nossas tentações, da nossa imperfeição e deste sentido que nos há de acompanhar até ao fim, este sentido do inacabado, do inconcluído, do irreparável que há de acompanhar-nos sempre. O que é o Advento? Eu penso que o Advento, anualmente, é o interromper a conversa. Nós, todos nós, estamos com uma conversa qualquer na nossa vida. Uma conversa mais feliz ou mais infeliz, mais narcísica ou mais egoísta ou mais na relação com os outros, mais isto ou mais aquilo. Estamos numa conversa e estamos a debater-nos por encontrar uma solução e um sentido, que nem sempre é óbvio, que raramente é evidente, e que quase nunca é fácil, para não dizer nunca. Estamos neste debate connosco, com os outros, com Deus, colocamos perguntas. E o que é que é o Advento? O Advento é uma interrupção. A conversa interrompe-se. E interrompe-se com um cortejo, que nos vem anunciar um nascimento, que nos vem abrir os olhos para olharmos para a vida, a vida no seu milagre, na sua essencialidade, a vida Vida, a vida estreme, a vida sem mais. Porque Jesus nasce e o que nós temos é a vida estreme. Ali não há ornamentos, não há decoração. Ele nasce naquela circunstância de completo desprovimento, sem nada, naquele curral de animais onde é só a vida que conta. Maria coloca o filho na manjedoura dos animais para mostrar que é daquela vida que nós nos temos de alimentar. Queridos irmãos, interrompamos mesmo. Que o tempo do Advento seja um tempo para interromper, interromper, interromper. Isto é: suspender as nossas questões, suspender as nossas amarguras, suspender os nossos longos percursos, suspender a nossa inquirição àquilo que não tem resposta, ou então aquilo cuja resposta não nos cabe colher. Interromper. E preparar o nosso coração para o encontro com a vida, com a vida estreme, com a vida que começa, com a vida que é nova, com essa vida encarnada que nos mostra na nossa carne, na nossa história, o próprio Deus. (Pe. Tolentino Mendonça)

terça-feira, 2 de dezembro de 2014

PROJECTA-TE para CRISTO sendo HOSPITALEIRO

Iniciámos o «Advento» e com ele mais um ano litúrgico. Esta palavra significa «vinda». O Advento é o tempo litúrgico que prepara a «vinda» do Senhor – o Cristo. Nós cristãos professamos que Deus é Amor e veio salvar o Seu Povo. Procuramos na fé, ao longo deste tempo, tomar consciência, cada vez mais profunda, de que o anúncio da salvação se cumpriu já e o Salvador veio, ressuscitou, está connosco e vive e faz-nos viver. E assumimos uma atitude de vigilância, esperando a vinda gloriosa de Jesus estabelecendo a «nova terra e os novos céus», comprometendo-nos na edificação dum mundo mais justo e solidário. Na liturgia de Advento, duas figuras se destacam como guias e modelos a seguir, na preparação do Natal: • João Baptista, o percursor (aquele que vai à frente) de Jesus, cuja pregação é um convite à conversão, como indispensável condição para a salvação; • E a Virgem Maria, «a serva do Senhor», que se projectou e acolheu plenamente na vontade do Seu Senhor e esperou, na alegria, a Sua vinda ao mundo. Estas duas figuras do advento são exemplo claro de disponibilidade e de HOSPITALIDADE. Não é fácil definir um valor-virtude tão rico e complexo como este. Muitas vezes, em linguagem coloquial falamos de hospitalidade de modo arbitrário, nivelando-o com outros conceitos análogos, como por exemplo, altruísmo, generosidade, compaixão ou solidariedade. Etimologicamente a palavra “hospitalidade” vem do latim hospes-hospitis (hóspede, estrangeiro, viajante) que deriva do adjectivo hospitalis, que significa qualidade própria de quem exerce a hospitalidade. A hospitalidade consiste em acolher um estranho e vulnerável na própria casa. Isto é, não há hospitalidade sem acolhimento. Mais, dizemos que alguém é hospitaleiro quando exerce a capacidade de acolher outro ser humano no seu círculo íntimo, na sua privacidade – na sua vida. Daí que, à partida, necessitemos de criar e trabalhar um “espaço”, um cubículo, um tecto, um lugar simbólico e/ou afectivo para receber o outro e a sua vulnerabilidade. Mas atentemos nisto: ser hospitaleiro consiste em acolher alguém “estranho”. Mas quem é o “estranho”? É esse sujeito que não faz parte do meu universo racial, social, religioso, linguístico, cultural e/ou económico. Hospitalidade significa, portanto, acolher o outro na minha “CASA” e fazer o possível para que ele se sinta como na sua. A casa aparece aqui na definição não como espaço geográfico ou físico mas como espaço ético. A casa existe enquanto tal quando se dá um lugar de intimidade e de reconhecimento do outro. Quando nela se respeita a liberdade alheia e a sua privacidade. Acolher o outro é disponibilizar o meu espaço para o outro, sem o neutralizar. Isto requer, antes de mais nada, o reconhecimento do outro, do seu direito a existir, da sua dignidade e das suas necessidades. Reconhecer a dignidade do outro significa partir da convicção de que o outro não é um instrumento. É uma pessoa, criado à imagem e semelhança de Deus, e como tal, não tem valor pelo que faz ou pelo que diz, pelo que não faz ou deixa de dizer, mas tem valor em si mesma pelo simples facto de ser pessoa. Tem, aquilo a que se chama, dignidade intrínseca, isto é, algo que não depende de elementos externos ou variáveis com o tempo ou as circunstâncias. E, por que todo ser humano é pessoa… tem direito a ser acolhido. Acolher é agir. Não no sentido de fazer coisas, em andar de um lado para o outro em muitas actividades que, em muitos casos não passam de “fogo para ser visto”, mas em dar espaço e tempo ao outro. No Natal de Jesus, não houve uma «CASA» para Ele vir ao mundo, mas foi acolhido, em primeiro lugar, por Maria e José; anunciado por João Baptista e, sobretudo, aquecido entre animais. Pois é aqui, neste agir “humanizador” dos animais que nós, “discípulos missionários” de Jesus, Maria, Vicente de Paulo e Catarina Labouré, queremos ser reconhecidos. Um Santo Natal e um Novo Ano pleno de VIDA para ti e tua família. Pe. Fernando, CM